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A situação dos presídios no estado do Rio de Janeiro

A origem do conceito de prisão como pena para infrações da ordem instituída tem origem nos mosteiros da Idade Média, com o propósito de punir os monges e clérigos que não cumpriam com suas funções. Os que faltavam com suas obrigações eram coagidos a se recolherem em suas celas e se dedicarem à meditação e à busca do arrependimento, ficando dessa forma mais próximos de Deus.

No Brasil, as prisões com celas individuais, oficinas de trabalho e uma arquitetura própria para o cumprimento da pena começam a surgir no Século XIX.

A primeira unidade prisional brasileira foi a Casa de Correção (1834/1850), que em 1941 foi transformada em Penitenciária Central do Distrito Federal e em 1957 na Penitenciária Lemos Brito, implodida em 2006.

No estado do Rio de Janeiro, o sistema prisional faz parte da estrutura da Secretaria de Administração Penitenciária, que organiza as unidades em três grandes áreas.

Área

Quantidade de Unidades

Complexo de Gericinó

25

Grande Niterói/Interior

14

Grande Rio

13

 

1 – Censo do sistema prisional

O censo do sistema prisional é realizado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por meio do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário.

A instituição do censo atende a uma resolução do Conselho Nacional de Justiça de 2015, que determina a produção de dados institucionais, confiáveis sobre o sistema carcerário. O Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário faz também o tratamento dos dados e fiscaliza o sistema prisional em todo o estado do Rio de Janeiro.

Os dados referentes a julho de 2018 mostram o seguinte quadro no estado do Rio: 

Retratos da Intervenção - Censo do Sistema Prisional - Gráfico 1.PNG

Retratos da Intervenção - Censo do Sistema Prisional - Gráfico 2.PNG

Retratos da Intervenção - Censo do Sistema Prisional - Gráfico 3.PNG

Retratos da Intervenção - Censo do Sistema Prisional - Gráfico 4.PNG

Presas Grávidas e Lactantes Por unidade Prisional

Unidade Prisional

Presas

Situação

Total

SEAPTB – Talavera Bruce

Gestantes

Condenada

3

Provisória

10

TPMI – Unidade Materno Infantil

Lactantes

Condenada

5

Provisória

5

 

2 – Desafios do Sistema Prisional

Em março de 2018, a Defensoria Pública do Rio de Janeiro divulgou relatório sobre a superlotação dos presídios. A ocupação era 51.511 presos para 28.688 mil vagas. Os dados de março de 2018 mostram o seguinte quadro:

Retratos da Intervenção - Censo do Sistema Prisional - Gráfico 5.PNG

No relatório, a precariedade e a gravidade da situação de algumas unidades foram destacadas.

No Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho, a precariedade das condições físicas, além da superlotação, fizeram com que a Corte Interamericana de Direitos Humanos recomendasse seu fechamento.

A Cadeia Pública Tiago Teles, em São Gonçalo, possui um percentual de ocupação de 212%, abrigando 1.963 pessoas com capacidade de vagas de 630 presos.

A Cadeia Pública Patrícia Acioli, também em São Gonçalo, está com 180% de ocupação; a Cadeia Pública Contrin Neto com 164%; e a Penitenciaria Milton Dias, em Japeri, com 137% de ocupação.

Além da superlotação de presos, a quantidade de agentes penitenciários também é apontada como temerária. O último concurso da Secretaria de Administração Penitenciária é de 1988 e além da necessidade de profissionais ser calculada para uma taxa de ocupação bastante inferior a real, o quadro de pessoal conta com vários profissionais que já se aposentaram.

A crise financeira do governo do estado também implicou em redução de recursos. Os presídios fluminenses convivem com atraso e ausência de pagamentos aos fornecedores, o que gera mais precariedade na alimentação, na provisão de material de higiene e de consumo, tornando a situação um caldeirão prestes a explodir.

As condições de higiene e manutenção do espaço predial com essa situação de superlotação também tem como consequência o aumento de doenças típicas do convívio em ambiente insalubre. O índice de tuberculose assim como de outras doenças infectocontagiosas cresceu muito.

Em outro relatório, a Defensoria Pública alertou para as condições de saúde dos presídios. Em 2017 houve 266 óbitos. Apenas nos primeiros quatro meses de 2018 houve 55 mortes por doença. Destas, 53 pessoas morreram de tuberculose, pneumonia e complicações decorrentes de infecções pulmonares. Nesse universo, 35 tinham menos de 40 anos de idade.

De acordo com o levantamento, boa parte das mortes envolve pessoas jovens, portadores de diabetes ou hipertensão, segundo a Defensoria Pública.  

Em outra pesquisa realizada pelo Instituto Igarapé, foram levantados 442 presos mortos entre 2017 e 2016:

- 278 por doença (sem especificação)

- 117 sem causa informada

- 17 por insuficiência respiratória

- 13 vítimas de violência

- 12 suicídios

-  5 outros

A demora nos processos jurídicos é apontada por especialistas como uma das principais causas para o excesso de lotação. Cerca de 22.000 pessoas, ou seja, 44% da população carcerária é composta por detentos esperando julgamento.

Entrevistas

Entrevista 1 - Agente Penitenciário

Em 2016, a Organização Internacional do Trabalho, OIT, considerou a profissão de agente penitenciário a segunda profissão mais perigosa do mundo. Você concorda?

Olha, não precisa OIT dizer isso não. É só olhar aí pra nossa condição de trabalho, no Brasil todo, não é só aqui no estado do Rio, não. É só ler jornal que você vai ver as condições de trabalho nos presídios. Não é coisa pra gente fraca não!

O que torna o trabalho tão perigoso?

A senhora imagina que num presídio que cabem, por exemplo, 100 pessoas, tem 200 ou 300 amontoados. A cada ano o quadro piora com a situação do governo, a falência desse governo aí. Comida, estrutura, tudo só piora.

A gente vive com uma corda no pescoço, sabendo que a qualquer momento pode estourar uma rebelião. E aí, quando estoura, é o inferno. Mas inferno mesmo!

Tô há quinze anos nesse trabalho. E só vi as condições piorarem.

Já sofreu algum tipo de violência no trabalho?

Violência propriamente dita não. Uma coisinha ou outra talvez... Mas já fui ameaçado e pedi transferência, porque com esses caras não se brinca não.

Já perdi companheiro de trabalho assassinado por prisioneiro. Tem alguns que não têm mais nada pra perder e a violência parece que já tá na alma do cara. E se não matar lá dentro, manda matar aqui fora.

Como esse quadro poderia ser modificado?

Eu vou lhe dizer que esse sistema que tá aí não educa ou transforma ninguém. Se o cara vai preso, lá dentro ele só tende a piorar, se envolver mais na bandidagem.

A verdade é que o sistema já faliu há muito tempo. Os presídios não têm condições de receber tantos prisioneiros. Não tem como nem alimentar mais tanta gente!

Para não falar na corrupção, né?

Então, eu acho que não tem mais jeito não. Explode tudo e começa de novo, de outro jeito. Sério!

Entrevista 2 – Mulher, 56 anos, teve o filho preso e morto de tuberculose, no presídio.

Há quanto tempo seu filho estava preso?

No presídio chegou a fazer um ano. Mas ele ficou um tempo na delegacia também.

Qual foi o crime que ele cometeu?

Ele foi pego roubando uma pessoa na rua. Roubo, né?

E o que aconteceu no presídio?

Eu fui vendo o meu filho definhar. Eu ia sempre na visita, sempre. Levava fruta, um bolo que eu fazia, levava sabonete, até xampu, desodorante. Mas eu fui vendo ele definhar, ficar com aquela cor verde.

Mas o que ele teve?

Tuberculose. Foi o que me disseram quando ele morreu. Mas só descobriram depois? Não teve um médico para examinar aquela tosse, aquela magreza?

Eu só soube que ele tinha morrido quase uma semana depois. Eu sei que ele errou. Mas foi preso e comeu o pão que o diabo amassou, viu? Se tem Deus no céu, ele viu que o castigo foi pior que o erro. Ah, foi sim.

Mas ele não teve tratamento médico?

E alguém me disse alguma coisa? Bandido, filho de pobre como nós aqui, sem instrução, não tem direito a nada! Eles prendem é para matar. Diz que não, mas é para matar de fome e de doença.