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Assistência social em áreas violentas, os desafios diários do trabalho social

O Sistema Único da Assistência Social (SUAS) criou equipamentos públicos voltados para atender diretamente a população alvo da política de assistência. Os Centros de Referência da Assistência Social (CRAS) são unidades localizadas dentro das comunidades de baixa renda que devem oferecer serviços de proteção e promoção social.

No entanto, a violência tem comprometido esse trabalho em muitas comunidades do Rio, prejudicando os usuários e também os trabalhadores sociais. É uma situação que abre imensas lacunas na oferta de serviços que possam suprir privações sociais e que acaba gerando violação de direitos e mais violência.

Comunidade Pavão-Pavãozinho

A comunidade Cantagalo-Pavão-Pavãozinho está localizada na Zona Sul da cidade do Rio de Janeiro, entre os bairros de Copacabana e Ipanema. A ocupação da região teve início na década de 30, na área de encosta da Mata Atlântica, e atraiu inúmeras famílias nordestinas que vislumbravam a oportunidade de trabalho e geração de renda na proximidade de bairros com poder aquisitivo alto.

Uma comunidade formada por habitações sem saneamento básico, insalubres, ausência de infraestrutura habitacional, graves índices de pobreza e tráfico de drogas.

Mas a violência é atualmente o maior problema do Pavão-Pavãozinho. De acordo com o Censo 2010, do IBGE, a comunidade tem 5.567 moradores, em 1.840 domicílios. Fica em seu território a 5ª Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) do estado, inaugurada em 23 de dezembro de 2009. A mesma UPP atua no Cantagalo, onde vivem 4.771 pessoas.

 

O que é o Centro de Referência da Assistência Social, CRAS?

O CRAS é uma unidade pública da assistência social, de responsabilidade das prefeituras, e funciona como porta de entrada dos serviços de proteção social básica às famílias, indivíduos e comunidades que se encontram em situação de vulnerabilidade. É no espaço do CRAS que esses serviços devem ser organizados.

O CRAS deve estar inserido em territórios com maior índice de famílias em vulnerabilidade social. Compete a ele fazer a vigilância social do território, para conhecer a realidade das famílias, comunidades e os serviços que existem na sua área de abrangência. A Prefeitura do Rio de Janeiro possui 47 CRAS implantados, distribuídos em todas as regiões da cidade.

 

CRAS Pavão-Pavãozinho

O CRAS Sebastião Teodoro Filho foi implantado há 10 anos na comunidade do Pavão-Pavãozinho, em um prédio compartilhado com a Clínica da Família, da Secretaria Municipal de Saúde.

O território de abrangência do CRAS inclui os bairros de Copacabana, Ipanema, Leblon, Leme e parte da Lagoa. Atende as comunidades localizadas nesses bairros, que são: Chapéu Mangueira, Babilônia, Cabritos, Tabajaras, Pavão-Pavãozinho, Cantagalo e Cruzada São Sebastião, onde estão localizados os polos de atendimento do CRAS.

O CRAS oferece os Serviços de Convivência e Fortalecimento de vínculos para crianças, jovens e idosos. O acompanhamento familiar é realizado pelo Programa de Atendimento Integral às Famílias (PAIF).

O total de atendimentos dos polos vinculados ao CRAS Sebastião Teodoro soma 8.619 famílias inscritas no Cadastro Único do Governo Federal; 2.883 famílias com perfil do Programa Bolsa Família; 686 famílias inseridas no Programa Cartão Carioca, que também transfere recursos para as famílias mais pobres.

A equipe é formada por três assistentes sociais, dois administrativos, uma pedagoga e quatro orientadores sociais. Mesmo vivenciando o clima de violência no dia a dia da comunidade, o CRAS mantém suas atividades e tem sido uma referência para as famílias e indivíduos na garantia de direitos.

A violência na comunidade e o trabalho no CRAS

A violência constante nas comunidades de abrangência do CRAS Sebastião Teodoro tem gerado nos moradores muita insegurança e preocupação. Além de serem diretamente vitimados, a violência também dificulta sua rotina diária, impedindo, por exemplo, que cheguem ao trabalho ou acessem os serviços públicos. As disputas entre facções que existem dentro das comunidades impedem muitas vezes que o morador circule para além do lugar em que mora.

Os CRAS que localizados em áreas de risco tem seu funcionamento comprometido em função da constante violência local, o que consequentemente faz com que os usuários tenham dificuldades de acessar os serviços. Muitas vezes os centros precisam fechar suas portas por conta de confrontos.

A violência também faz com que os CRAS tenham atuação limitada, seja pelos constantes riscos, principalmente com tiroteios, seja pela desmotivação das equipes, que não conseguem dar continuidade ao trabalho.

As equipes se mobilizam para atender, minimamente, as situações de risco e vulnerabilidade por meio das visitas domiciliares, porém os frequentes confrontos limitam as ações.

 

Entrevistas

Entrevista 1 - Diretora do CRAS

Como você chegou à direção do CRAS?

Foi um convite da coordenação do Núcleo de Proteção Básica da Secretaria Municipal de Assistência Social e Direito Humanos, SMASDH.

Está há quanto tempo na direção do CRAS?

Dois anos e 10 meses

Como é trabalhar dentro de uma comunidade violenta?

A violência hoje é inerente a nossa sociedade e significativamente aviltante em nossa cidade. A melhor estratégia neste contexto é estar atento aos sinais que o próprio território emite, bem como consolidar as relações com a rede local, e sua população alvo. Os desafios nos são postos a todos instantes e é fundamental ser propositivo e criativo neste contexto. Ignorar a violência não é uma opção, considerando que, em vários momentos, ela condiciona nossa intervenção.

Já sofreu algum tipo de ameaça no serviço?

A ameaça se configura em todo tempo em que você está direcionado por sua função e atribuições. Ela está presente em territórios conflagrados pela violência urbana, contudo, ameaça iminente e direcionada a minha pessoa em particular eu nunca sofri.

Em algum momento pensou em desistir da direção do CRAS?

Sim, mas para me dedicar ao processo seletivo para o mestrado.

Sua saúde já ficou abalada por trabalhar em um CRAS dentro de comunidade?

Sim.

A realidade de confrontos na comunidade prejudicou as metas a serem cumpridas no CRAS?

Sim, principalmente as que careciam de inserção pela comunidade.

Já precisou fechar o CRAS por conta da violência?

Sim, várias vezes.

 

Entrevista 2 - Assistido do CRAS. A identidade dele será mantida em sigilo, por medida de segurança

Você acha importante ter o CRAS em sua comunidade?

No início eu não sabia o que era, mas depois que conheci eu vi que é muito importante sim.

Por que você procurou o CRAS?

Porque moro na comunidade e as assistentes sociais fizeram propaganda do que as famílias poderiam conseguir. Eu vim atrás do Bolsa Família.

O que o CRAS fez por sua família?

Ah, eu tenho muitos filhos. Elas me ajudaram com o Bolsa Família e gosto das reuniões que fazem.

Havia alguma informação sobre seus direitos que você não sabia e o CRAS te ajudou a resolver?

Elas explicam direitinho sobre o que devo fazer se sofrer violência em casa, sobre conseguir vaga na escola, sobre benefício para os idosos e criança doente. Olha, muita coisa que não lembro agora.

Você participa de alguma atividade no CRAS?

Participo das reuniões que elas fazem para as famílias, é bom porque podemos trazer um monte de problemas.

O que você acha que poderia melhorar no atendimento do CRAS?

O problema está na comunidade com tanto tiroteio, e aí às vezes a equipe não pode nos atender.

Já recebeu visita das pessoas que trabalham no CRAS em sua casa?

Mais de uma vez.