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Criança em sinal de trânsito, uma infância perdida

Trabalho infantil

Uma das maiores violências contra crianças e adolescentes é o trabalho precoce. As condições em que ocorre o trabalho infantil incluem diversas privações, como a falta de escola integral e a precariedade do funcionamento das escolas existentes.

Nos centros urbanos, o trabalho infantil geralmente aproxima crianças e adolescentes da violência. Segundo levantamento realizado pelo IBGE, em 2017, cerca de 2,7 milhões de crianças e adolescente, de 5 a 17 anos de idade, exercem algum tipo de trabalho, incluindo atividades agrícolas, domésticas, exploração sexual, tráfico de drogas, trabalho em lixões, carvoarias, pedreiras ou como vendedores de rua (nos sinais e como ambulantes).

Crianças e adolescentes trabalham na informalidade, com pouca ou quase nenhuma remuneração, expostos a locais perigosos e insalubres, sendo que 70% são do sexo masculino, e 63% são negros (IBGE, Pesquisa Nacional de Amostra por domicílio, PNAD 2017).

Na cidade do Rio de Janeiro, segundo o levantamento feito em 2015 pela então Secretaria Municipal de Assistência Social e Direitos Humanos, atual Secretaria de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos, havia 513 crianças e adolescentes trabalhando nas ruas.  Eram 252 crianças com até 11 anos de idade e 261 adolescentes. Dentre eles, 384 são meninos e 232 trabalhavam vendendo balas e doces em sinais de trânsito.

O fato é que o trabalho infantil rouba o direito à infância e afasta a grande maioria dos pequenos trabalhadores das escolas. E, diante deles, é comum a opinião de que trabalham para não roubar, para ajudar a família ou mesmo que o trabalho é positivo porque os mantêm ocupados.

 

Escola parcial x escola integral

Garantir a permanência de crianças e adolescentes na escola em tempo integral é um dos maiores desafios do pode público na área da educação. O modelo educacional vigente pouco oferece além das quatro horas diárias em sala de aula, além de ter uma metodologia pedagógica inadequada, que não atrai os alunos. Soma-se a isso a constante falta de professores e a precariedade das condições em que eles trabalham.

A maior parte das crianças e adolescentes que trabalham nas ruas, nos sinais de trânsito, está fora da escola ou não frequenta as aulas com regularidade. Quando perguntados sobre o assunto, dizem que não gostam de estudar, que na escola “não tem aula” e que não se sentem atraídos pelo espaço escolar.

A escola em tempo integral deve mais uma vez ser citada como uma ferramenta importante para a permanência das crianças e adolescentes na escola e para a garantia de melhores resultados de aprendizagem e participação. Ela traz um projeto pedagógico que trabalha a formação integral do aluno e não apenas o ensino tradicional. Oferece atividades que despertam o lado artístico, cultural, esportivo, emocional e educacional. Ou seja, possibilita atrair o aluno.

Os problemas atuais do modelo educacional, a inadequação de um projeto pedagógico mais amplo e a precariedade das escolas levam certamente ao aumento da evasão escolar. E uma vez fora da escola, o trabalho e a permanência nas ruas se apresentam como os caminhos mais prováveis de serem trilhados.

Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI)

O governo gederal criou o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), em 1996, com o objetivo de retirar as crianças e adolescentes da situação de trabalho precoce. O programa prevê a transferência de renda para as famílias de crianças que estavam envolvidas no trabalho, inclusão das crianças e adolescentes na escola formal, em atividades educativas e acompanhamento familiar.

O PETI foi um programa de referência, nacional e internacional, no combate ao trabalho infantil. Mas esse cenário mudou. O programa perdeu protagonismo entre aqueles de transferência de renda do governo federal e é crescente o número de crianças e adolescentes fora da escola e no trabalho infantil.

A retomada do programa, aliada à ampliação do horário escolar e à conscientização da sociedade, é fundamental no combate à evasão escolar e na erradicação do trabalho infantil. O PETI pode e deve prestar apoio e orientação às famílias por meio da oferta de projetos de geração de renda.

No entanto, a realidade das famílias pobres é marcada por um conjunto de privações e violações de direitos que reforçam a condição de miséria e empurram crianças e adolescentes para as ruas.

A integração entre as políticas públicas setoriais, principalmente políticas de trabalho, saúde, educação e assistência social, também é importante para que sejam criadas condições de uma inclusão social sustentável de famílias mais vulneráveis e, consequentemente, de crianças e adolescentes. Somente assim o PETI pode alcançar o objetivo de erradicar o trabalho infantil.

 

Sinal de trânsito, um local perigoso para trabalhar

Os sinais de trânsito são pontos de fixação das crianças e adolescentes nas ruas, por ser um local atraente de uso de drogas e geração de renda. O trabalho na rua, por menos lucrativo que seja, e as associações e relações construídas nestes pontos afastam definitivamente as crianças e adolescentes da família e da escola.

Em geral, estas crianças e adolescentes são exploradas por adultos que dizem que garantem sua proteção. Mas a verdade que ocorre é apenas exploração e exposição a inúmeros riscos.

Nas ruas da cidade, diariamente crianças e adolescentes pobres são roubadas de sua infância, do convívio familiar, da escola e do direito à vida.

 

Entrevista 1 - Daniel, que trabalha limpando vidros de carros

Você mora aonde?

Na Zona Sul.

Você trabalha no sinal há muito tempo?

Não, tia. É porque meu pai morreu, e tenho mais irmãos, tenho que me virar.

Qual sua idade?                                                                                                                                     14 anos.

Você está na escola?

Tô não, mas eu gosto de estudar.

Você consegue tirar quanto no sinal?

Sei lá.

Fica muito tempo na rua?

O dia todo.

 

Entrevista 2 - João, irmão do Daniel

Você é o que do Daniel?

Sou o irmão mais velho

Qual sua idade?

25 anos

Onde vocês moram?

Aqui na Zona Sul, mas a gente morava na Providência. Mas nosso pai morreu e nossa mãe está presa. Então eu fiquei responsável por eles. Somos três irmãos, tia.

Por que seus irmãos estão trabalhando no sinal?

Ah tia, temos que nos virar, né? Levar algum para casa. Eu ainda tenho uma mulher e uma bebê.

Vocês recebem o Bolsa Família?

Meu pai que recebia, mas depois que ele morreu, não recebemos mais.

E a escola?

Olha tia, o Daniel está fora da escola, mas eu vou procurar uma vaga pra ele aqui na Zona Sul. Eu queria também pegar um papel para poder ficar responsável pelos meus irmãos. Acho que temos direito a uma pensão do meu pai que morreu.

Ganha quanto na rua?                                                                                                           

Ah, depende, né? Mas, sei lá, acho que uns 100 reais por semana.