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Dossiê LGBT + do Instituto de Segurança Pública

O Instituto de Segurança Pública (ISP) afirma que a primeira edição do dossiê LGBT+ tem o objeto de dar visibilidade à(s) violência(s) LGBTfóbicas. Isso é, cometidas em função da existência de pessoas gays e transexuais.

Pretende, com sua divulgação, “sinalizar para as forças de segurança que a LGBTfobia é um assunto de atenção na agenda da segurança pública, além de embasar a elaboração de políticas públicas voltadas ao combate da LGBTfobia nos diversos meios sociais, como a criminalização da LGBTfobia e a discussão sobre gênero e sexualidade nos planos educacionais.”

O dossiê homenageia o grupo “Afirmação Homossexual”, que completa 40 anos de existência.

Em 40 anos, a população LGBT+ caminhou  importantes passos na estrada dos direitos sociais como a inclusão de redesignação sexual no Sistema Único de Saúde (SUS) em 2008, a permissão para adoção de crianças por casais homoafetivos em 2010 e o casamento civil igualitário em 2013. Porém ainda precisa caminhar muito no campo da violência. O dossiê aponta a ausência “de uma legislação específica que criminalize a LGBTfobia e de estatísticas oficias que contemplem a violência contra essa população”.

O dossiê avança significativamente na construção de políticas públicas ao organizar e dar visibilidade às primeiras estatísticas oficiais de crimes motivados por LGBTfobia.

Em 2017, foram 431 vítimas de violência motivada por LGBTfobia no estado do Rio de Janeiro que registraram ocorrência nas delegacias do estado. Mais da metade das vítimas (55,0%) conhecia os autores da violência e 43,4% dos crimes ocorreram em ambientes residenciais. É importante ressaltar que é necessário um esforço conjunto da população em notificar a violência sofrida e dos operadores de segurança em registrar adequadamente e analisar os casos com seriedade para que a realidade da violência LGBTfóbica seja retratada de maneira fidedigna pelas estatísticas oficiais. É a partir dessas estatísticas que são criadas e avaliadas políticas públicas de proteção à população LGBT+. Por fim, um agradecimento ao auxílio e presteza mostrados pelas instituições que colaboraram na execução deste trabalho.

O dossiê LGBT+ contou com a contribuição da Coordenadoria Especial de Diversidade Sexual (CEDS-Rio), da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), do Grupo Gay da Bahia (GGB),  do Grupo Pela VIDDA (GPV-RJ), do Núcleo de Defesa dos Direitos Homoafetivos e Diversidade Sexual (NUDIVERSIS), da Superintendência de Políticas LGBT da Secretaria de Estado de Direitos Humanos e Políticas para as Mulheres e Idosos (SUPPLGBT/ SEDHMI), da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (SEAP-RJ), da Subsecretaria de Educação, Valorização e Prevenção (SSEVP/SESEG), e da Área Técnica de Populações Vulneráveis - LGBT da Superintendência de Atenção Básica da Secretaria de Estado de Saúde (SAB/SES-RJ).

Introdução

O ISP utiliza o termo LGBTfóbico para nomear um pessoa homofóbica. A definição de homofobia é a utilizada pela Secretaria Nacional de Segurança Pública/SENAD: “ser homofóbico é repudiar, odiar, discriminar, temer, ter aversão a lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais”.

O dossiê contribui na visibilidade do público conceituando e diferenciando identidade de gênero de orientação sexual segundo as definições do SENASP.

“A identidade de gênero se refere a sentimentos, posturas subjetivas, representações e imagens relativas a papéis e funções sociais”, de modo que uma pessoa pode ou não se identificar com o gênero de seu nascimento. Uma pessoa transgênero é aquela que se identifica com um gênero distinto daquele de nascimento, por exemplo, uma pessoa nascida biologicamente do sexo masculino que se identifica como mulher. O cisgênero é aquele indivíduo que se identifica com o mesmo gênero do seu nascimento.”

 “Orientação sexual faz referência à direção do desejo afetivo e sexual. O homossexual é aquele indivíduo que se sente atraído por outro do mesmo gênero. Os bissexuais sentem atração por pessoas de qualquer gênero.”

Assim lésbicas, gays e bissexuais são categorizações de orientação sexual, enquanto travestis e transexuais se referem à identidade de gênero.

Uma das grandes dificuldades para reunir as ordens de grandeza das violências praticadas contra o público LGBTé o da subnotificação de registros. São listados alguns dos motivos para essa dificuldade:  “medo ou vergonha da vítima em expor sua identidade de gênero e/ou sua orientação sexual; crença de que a sua denúncia não será de fato registrada devido à inexistência de mecanismos legais que protejam a população LGBT+; medo de a vítima de ser revitimizada pelos operadores de segurança; desconhecimento da vítima para identificar atos específicos como LGBTfóbicos; e  uma gama de fatores que não impactam apenas a população LGBT+”. Os motivos expostos podem implicar na ausência de registros ou na falta de identificação da vítima como LGBT +.  Em ambos os casos, o resultado implica em uma subnotificação dos casos.

A subnotificação é mais expressiva no grupo de travestis e transexuais já que muitos indivíduos desse grupo utilizam a prostituição como forma de subsistência e tem medo de serem presas em função disto.

A base de dados utilizada foi coletada nos registros de ocorrência das diversas unidades de da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro /PCERJ.  Além da subnotificação de registros já mencionada, a ausência de legislações específicas também implica na subnotificação. Como exemplo, no caso de uma pessoa ser agredida verbalmente ou por meio virtual em função de sua identidade de gênero ou orientação sexual, não há categoria específica como nos casos de cor. As agressões são categorizadas de forma generalizada impossibilitando a quantificação dos casos específicos da população LGBT +. Para realizar essa quantificação, é necessária a leitura da dinâmica de cada fato. Como, em média, são gerados cerca de 60 mil casos por mês, a leitura das dinâmicas dos fatos foi descartada como viável pelo ISP.

A forma encontrada foi a triagem dos casos utilizando o campo constante nos registros de ocorrência de que descreve a motivação presumida e a busca de palavras chaves nas dinâmicas descritas que podiam descrever um crime de LGBTfobia.

Em 2012 foi incluído, no campo “motivação presumida”, a opção homofobia. Em 2017, as opções foram expandidas para transfobia e lesbofobia. Contudo, em geral o campo é preenchido como desconhecido”.

O uso das palavras chaves indicou os registros aonde fosse mencionado qualquer pessoa LGBT +. A partir dessa identificação, o registro era lido na integralidade por um policial civil da equipe do ISP para a triagem dos crimes motivados por LGBTfobia, já que o foco eram os crimes motivados por LGBTfobia (repúdio, ódio, discriminação, temor ou aversão a um LGBT) e não os crimes praticados contra pessoas LGBT independente da motivação. Por isso, os crimes de roubos e furtos não foram contabilizados.

Palavras Chaves Utilizadas

1. Baitola

11. Homofóbico

21.Transexual

2. Homossexualismo

12. Sapatona

22. Chupa-rola

3.Queima-rosca

13. Viadinho

23. Lésbica

4. Viadagem

14.Bichona

24. Transfobia

5. Bicha

15. Homossexual

25.Gay

6. Homossexualidade

16. Trans

26. Lesbofobia

7. Sapatão

17.Viado

27. Traveco

8. Viadão

18.Boiola

28.Homofobia

9.Bichinha

19. Mulher-macho

 

10.Travesti

20.Orientação sexual

 

 

Ressalta-se que os registros são feitos de acordo com o relato das vítimas, sendo registradas as expressões utilizadas. É importante enfatizar que a dinâmica do registro de ocorrência é preenchida. Buscou-se também categorizar se a vítima era travesti ou transexual (identidade de gênero) e se era homossexual ou bissexual (orientação sexual), bem como características como sexo de nascimento, idade, cor, relação da vítima com o autor e tipo de local do crime.

Panorama da violência por LBGTfobia

Foram identificadas 431 vítimas ao longo do ano de 2017. Os números coletados foram afetados pela paralisação da polícia civil de janeiro a março.

Retratos da Intervenção - Dossiê LGBT - Vítimas LGBTfobia.PNG 

Foi utilizado como base o grupamento de crimes utilizados nas análises de violências contra a mulher como preconizado pela Lei Maria da Penha e incluídos alguns delitos em cada grupamento característicos dos crimes de LGBTfobia.

Violência física englobando homicídio doloso, lesão corporal dolosa, maus tratos, sequestro ou cárcere privado, tentativa de homicídio, tentativa de lesão corporal dolosa e vias de fato

Violência sexual

Violência patrimonial englobando apropriação indébita, dano, supressão de documentos e violação de domicílio

Violência moral englobando abuso de autoridade, calúnia, desacato, difamação, falsa identidade, injúria, ultraje a culto, e impedimento ou perturbação de ato a ele relativo

Violência psicológica englobando ameaça, constrangimento ilegal e submeter uma criança ou adolescente a vexame ou constrangimento, assédio sexual, ato obsceno, importunação ofensiva ao pudor e tentativa de estupro

Outros tipos de violência englobando desaparecimento, fato atípico e medida assecuratória de direito futuro

 Retratos da Intervenção - Dossiê LGBT - vítimas por tipo violência.PNG

O grupo “outros tipos de violência “ agrupa violências que, pelo Código Penal, não configuram crimes, mas que são consideradas por especialistas significativas para ilustrar as dificuldades do público LGBT+  em conseguir amparo frente à violência a que são submetidos.

A título de esclarecimento, o dossiê exemplifica os casos citados acima reproduzindo algumas dinâmicas relatadas.

Fato Atípico

"Relata o comunicante que na data [...], foi até ao estabelecimento não identificado a fim de cortar seu cabelo. Ocorre que o comunicante foi recebido por pessoa não identificada, que estava na recepção e disse: "NÃO ATENDEMOS MULHER". O comunicante insistiu para ser atendido já que iria fazer um corte masculino, porém sem êxito. A pessoa não identificada disse que se tratava de norma da casa. O comunicante se identifica como transexual e estava trajado com roupas masculinas".

Medida Assecuratória de Direito Futuro

“Relata o comunicante que na data [...], sua mãe, após estar ciente de que o comunicante é homossexual, fez duas ligações de cerca de 20 min, ao todo, proferindo uma série de ameaças. Foi acusado de tê-la abandonado doente, de tê-la roubado e de tê-la agredido fisicamente. Ela ameaçou ir atrás do namorado e dos amigos do comunicante. O comunicante afirma que nenhuma dessas acusações procede, nunca lhe faltou com respeito, nem a agrediu física ou psicologicamente. O comunicante gostaria de deixar registrado para se precaver da concretização de alguma dessas ameaças”.

Retratos da Intervenção - Dossiê LGBT - vítimas mulheres.PNG

Orientação sexual: é a direção para qual se inclina o desejo de se relacionar com alguém, seja afetiva ou sexualmente, e pode variar de acordo com o gênero pelo qual a pessoa se sente atraída.

Heterossexual: pessoa que se relaciona afetiva ou sexualmente com pessoas do gênero oposto ao que ela se identifica.

Homossexual: pessoa que se relaciona afetiva ou sexualmente com pessoas do mesmo gênero ao que ela se identifica.

Bissexual: pessoa que se relaciona afetiva ou sexualmente com pessoas de ambos os gêneros.

Identidade de gênero: é a forma como o indivíduo se vê, é reconhecido e se reconhece na sociedade.

Cisgênero: pessoa que vivencia e se identifica com a identidade de gênero que lhe foi atribuída no nascimento.

Transgênero: termo abrangente que denomina pessoa que não vivencia e não se identifica com a identidade de gênero que lhe foi atribuída no nascimento, englobando homens trans e mulheres transexuais.

Travesti: pessoa que não se identifica como pertencente ao gênero masculino e tampouco reivindica a identidade de mulher, mas está inserida dentro da diversidade do gênero feminino por vivenciar e expressar o gênero feminino, independente de suas alterações corporais.

Transexual: pessoa que possui uma identidade de gênero diferente daquela designada no nascimento.

Retratos da Intervenção - Dossiê LGBT - número homens.PNG

No total de vítimas, 47,5 % eram homens (sexo no nascimento) e 40,2% eram mulheres ( sexo no nascimento) e 0,2% não tiveram seu sexo de nascimento registrado.

 - 5,8% das vítimas não tiveram o sexo registrado.

- 40% das vítimas não tiveram a orientação sexual registrada

- 60% das vítimas não tiveram a identidade de gênero registrada

Retratos da Intervenção - Dossiê LGBT - vítima sexo nascimento.PNG 

Retratos da Intervenção - Dossiê LGBT - víítima nascimento masculino.PNG

Identidade de gênero: é a forma como o indivíduo se vê, é reconhecido e se reconhece na sociedade.

Cisgênero: pessoa que vivencia e se identifica com a identidade de gênero que lhe foi atribuída no nascimento.

Transgênero: termo abrangente que denomina pessoa que não vivencia e não se identifica com a identidade de gênero que lhe foi atribuída no nascimento, englobando homens trans e mulheres transexuais.

Retratos da Intervenção - Dossiê LGBT - vítimas cor.PNG

Retratos da Intervenção - Dossiê LGBT - vítima idade.PNG

Retratos da Intervenção - Dossiê LGBT - vítima autor violência.PNG

 - 55% das vítimas possuíam algum vínculo com os autores

Retratos da Intervenção - Dossiê LGBT - vítimas local fato.PNG

 - Percentual expressivo das violências indica locais conhecidos pela vítima

Retratos da Intervenção - Dossiê LGBT - vítima região.PNG

 Há uma concentração de crimes sobretudo na cidade do Rio de Janeiro. É importante salientar que existe a possibilidade de a concentração em determinadas regiões ser favorecida por oferecerem ambientes mais LGBT+acolhedores às vítimas, favorecendo o registro.

A publicação da primeira edição do Dossiê LGBT+ traz um importante panorama de informações necessárias a criação, ampliação e melhoria das políticas públicas voltadas ao público LGBT+.

Trata-se de documento inédito que promove a visibilidade da reunião na esfera de governo – municipal, estadual e federal -, nos estatutos jurídicos das instituições – e na esfera não governamental, assim como na transversalidade dos campos de conhecimento e atuação – segurança pública, educação, saúde, assistência social e direitos humanos. O objetivo é o esforço de avançar na garantia de equidade de tratamento a população LGBT+.