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Tiroteios no Rio de Janeiro

Desde que o Laboratório de Dados Fogo Cruzado começou, em 2016, a divulgar o número de tiroteios/disparos por arma de fogo que ocorrem na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, o mês de agosto bateu o recorde de ocorrências. Foram 1014 registros.

Em abril deste ano, a Pesquisa Datafolha em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública revelou que nove em cada dez moradores da cidade do Rio têm medo de tiroteio, bala perdida ou de morrer em um assalto.

O medo é bastante justificado: 30% dos entrevistados já estiveram realmente nomeio do fogo cruzado entre bandidos e polícia, e três em cada quatro pessoas afirmam ter ouvido um tiroteio nesse período.

Em agosto passado, o Fogo Cruzado mapeou 1014 tiroteios/disparos na Região Metropolitana. Foram 158 ocorrências a mais que o mais de julho, um aumento de 23%.

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2. O Laboratório de Dados Fogo Cruzado

O Fogo Cruzado é um Data lab: um laboratório de dados sobre violência armada. As informações são disponibilizadas por meio de um aplicativo e mapa colaborativo.

A plataforma digital foi originalmente desenvolvida pela Anistia Internacional Brasil. Em janeiro de 2018, o projeto tornou-se independente e autônomo, sob a coordenação do Instituto Update, e não tem mais qualquer relação com a Anistia Internacional.

O aplicativo faz alertas em tempo real sobre tiroteios/disparos de arma de fogo na região metropolitana do Rio. Utilizado no celular, ajuda o morador a se proteger e informar amigos e parentes sobre regiões de risco. Mas o aplicativo é também uma importante ferramenta para o registro de dados atualizados sobre a incidência de tiroteios e a prevalência de violência armada, que podem ser úteis na formulação de estratégias de segurança pública.

As informações consolidadas pelo Laboratório de Dados são enviadas pelos usuários do aplicativo e via WhatsApp, Twitter e Facebook, recolhidas na imprensa e nos canais de divulgação das instituições policiais.

Por meio de filtros e cruzamento de informações de bancos de dados, o Fogo Cruzado disponibiliza dados atualizados e permanentemente checados.

Como escrevem os gestores do Laboratório, na sua página do facebook, “de forma interativa com a população, os mapas gerados pelo aplicativo podem ser agregados e combinados a informações de outras áreas, tais como a saúde e educação. Nesse processo, vamos obter aos poucos um retrato mais real da violência armada na cidade o que será útil para delinear políticas públicas mais abrangentes e eficazes de enfrentamento ao problema”.

É possível baixar o aplicativo nos seguintes links:                                                             

Link para Android: http://migre.me/w0MBr                                                                          

Link para iOS: http://migre.me/w0MDu

3. Ocorrências de tiroteios/disparos na Região Metropolitana do Estado do Rio

O maior número de registros está no Rio de Janeiro, capital, com 592 tiroteios/disparos. A seguir vem São Gonçalo, com 92 registros, Niterói com 74, Belford Roxo, 68 e Duque de Caxias, com 45.

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Em toda região houve um aumento de 23,06%. O único município que conseguiu diminuir as ocorrências foi Belford Roxo, na Baixada Fluminense, que saiu de 74 ocorrências em julho, para 68 em agosto.

Em Niterói, entretanto houve um aumento de 45,10% no número de ocorrência – de 51 em julho para 74 em agosto.

Os 10 bairros da Região Metropolitana com os maiores números de ocorrência de tiroteios/disparos com arma de fogo estão na capital, espalhados por todas as regiões da cidade – zona norte, zona sul, zona oeste. Estes tiroteios, somente no mês de agosto, deixaram 140 mortos e 80 feridos.

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Estes dados explicam porque pesquisas revelam que uma das maiores preocupações dos moradores da Região Metropolitana do Estado do Rio é a segurança pública. O medo de ficar no meio do fogo cruzado está presenta na vida de toda pessoa que precisa atravessar a cidade, a qualquer hora do dia.

 

Entrevistas

Entrevista 1 - Moradora do Leme, bairro da Zona Sul do Rio, em rua vizinha a favela Babilônia.

Você mora próximo a uma favela?

Moro sim.  Bem próximo. Da minha janela vejo parte da favela.

Então, quando tem tiroteio você escuta os tiros?

Os tiros parecem que estão dentro da minha casa. Se acontece durante a noite, na madrugada, ninguém dorme.

Quando aconteceu o último tiroteio?

Olha, acontece o tempo todo. Tiro sempre tem. Mas o último tiroteio mesmo aconteceu há uma semana mais ou menos. Mas é rotina já. A gente é obrigada a aprender a viver com isso. Com medo.

Como o tiroteio na favela vizinha afeta a rotina do bairro?

Muda tudo. As ruas de acesso ficam tomadas de policiais. Como minha rua é rota de fuga, o panorama é de muito medo e insegurança. A rua tomada de polícia e muito armamento.  As ruas mais esvaziadas. Não dá vontade de sair de casa. O fluxo de moradores que estão se mudando do Leme aumentou muito.

O que fazem os moradores? Da favela e do bairro.

Os moradores da favela ficam ilhados, até que a rotina de confrontos se acalme. Ficam reféns no meio disso tudo. Os moradores do bairro passam a sair rapidamente de casa e mais atentos no retorno. As ruas ficam bem mais vazias. Eu já estou até dormindo na sala porque o quarto já não traz segurança, fica de cara com a mata do morro.

Você trabalha em favelas, não é? Já ficou no meio do fogo cruzado entre bandidos e policiais?

Trabalho há anos em favelas, na área social. Já estive por 3 vezes presa, no meio de fogo cruzado.  É uma sensação de pavor misturada com a impotência. Uma das vezes saí correndo. Corri muito, tinha que sair de onde eu estava. E tive a sensação de que fui atingida por um tiro, a gente sente isso, sabe? Fiquei passando a mão pelo corpo todo para comprovar que de fato não havia acontecido nada. Só Deus mesmo para proteger.

Entrevista 2 – Moradora de favela, na zona norte da cidade do Rio, 39 anos.

Você sempre morou aqui na Vila Joaniza?                                                

Nasci e cresci aqui. Tive meus filhos aqui e agora meu netinho também nasceu aqui. Mas não tô falando isso com orgulho, não. Isso aqui tá que é um inferno.

E aqui sempre teve essa violência?                                                                            

Não foi sempre assim não. Claro que sempre teve polícia e os meninos, né? Isso é de lei. Onde tem tráfico tem polícia, não é assim? Mas nos últimos tempos, parece que tudo piorou. A gente escuta as histórias, não é mais só a briga entre eles, o terceiro comando e o comando vermelho. Agora tem milícia querendo entrar, tem a polícia que quer o arrego, se não tem, invade.  Tá tudo mais difícil. Desde o ano passado a gente tá vivendo no meio dos tiros.

Como o tiroteio afeta a rotina na favela?

A rotina da gente é o tiroteio (risos). Desculpe a brincadeira aí. Mas quase toda semana tem problema aqui. E a gente tem que se virar. Eu sou faxineira, trabalho em várias casas aí dentro da Ilha. E já perdi trabalho, canso de perder o dia por causa dos tiroteios, porque tem vezes que não dá pra sair nem de casa.Tem patroa que entende. Mas muitas não querem saber. E tão erradas? Tão não. Mas vai ficar difícil encontrar faxineira que não passe por isso que eu passo. Quem mora em comunidade vive esse problema o tempo todo, ué. E eu não vou colocar a cara aí pra morrer por causa de faxina. Paciência.

Você perdeu um parente em um tiroteio não foi?                                                                             

Foi sim. Meu tio. Levou uma bala perdida na barriga. Nem saiu daqui para o hospital. Já saiu morto. E por que? Porque tinha compromisso de ir trabalhar. Tinha que sair de madrugada para chegar lá pra Santa Cruz, num trabalho que tinha arranjado. A mulher falou para ele não ir, pediu pelo amor de Deus. Mas ele tinha começado na firma, não queira falhar. Pois morreu e deixou tudo aí. Os filhos, a mulher, casa para acabar a obra. Pergunta se o patrão veio nem saber o que houve. Nada. Quem ajudou no enterro foi aí os meninos. Aqui é assim mesmo. Tem que saber quem a gente é. Não pode dar mole pra não ser atropelado. E depois que morre, não tem mais jeito. Fica tudo aí...