Combate às milícias, uma meta importante da intervenção
As milícias no estado do Rio, sobretudo na capital, surgiram nos anos 70, mas assumiram o perfil atual no final dos anos 90, ganhando muita força nos anos 2000.
A denominação de “milícia” é uma tradução livre para uma organização militar ou paramilitar que se arma para controlar e defender territórios. No Rio, as milícias se constituíram a partir da organização de policiais militares, civis, agentes penitenciários, bombeiros e militares das Forças Armadas.
A ideia inicial de combater o tráfico de drogas e defender os moradores (se é que esta ideia de fato existiu) foi dando lugar aos grupos armados e poderosos que ocupam o lugar do Estado, cobrando “taxas e impostos" sobre serviços básicos como o transporte alternativo, a venda e entrega de gás e fornecimento de instalações clandestinas de canais de TV por assinatura. Práticas ilegais, mas que fazem parte da dura realidade de muitas comunidades no Rio.
Em 2009, o Núcleo de Pesquisas das Violências da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Nupevi- Uerj) apresentou estudo sobre as 1.006 favelas do Rio e identificou que 41,5% delas são dominadas por milícias; 55,9%, por traficantes; e 2,6% controladas pelas Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). Mas esses números já devem ter mudado.
A guerra entre milicianos e traficantes ganhou força a partir de 2015. O projeto dos milicianos é ocupar as favelas e dominar a economia local.
Zona Oeste do Município do Rio de Janeiro
Na Zona Oeste, entre 2010 e 2018, o número de áreas controladas pela milícia mais que dobrou. Formada por pelo menos 45 bairros, sendo os mais influentes Barra da Tijuca, Bangu, Campo Grande, Jacarepaguá e Santa Cruz, totalizando cerca de 2 milhões de habitantes e quase 900 km2 de território, a Zona Oeste é a região da cidade onde milicianos demostram mais poder e maior dominação territorial.
A exploração ilegal do transporte alternativo, a venda de gás e a oferta de canal à cabo clandestino enriquecem os milicianos que insistem em ser um estado paralelo.
CPI das Milícias
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Milícias, instalada na Assembleia Legislativa em 2008, foi um duro golpe nos milicianos.
O ex-vereador Jerônimo Guimarães Filho, o Jerominho, e o ex-deputado estadual Natalino José Guimarães, com outros veteranos, foram presos. Este grupo se autodenominava "Liga da Justiça”.
Mas a prisão destes líderes não acabou com as milícias e novas lideranças surgiram e se fortaleceram no contexto de insegurança e violência no Rio de Janeiro. Grupos seguiram assustando e extorquindo moradores de comunidades.
Uma vitória da Intervenção
No último sábado (7 ), a intervenção federal na segurança pública foi firme e direta no combate às milícias e seus comandantes no Rio.
Numa articulação muito bem planejada pela Secretaria de Segurança Pública, foram presos 149 suspeitos e foram apreendidas 32 armas.
Os milicianos, convictos de que estão fora do alcance da Justiça e de que podem fazer o que querem em uma cidade como o Rio, promoviam uma festa pública para 400 convidados em um sítio em Santa Cruz.
Mas a inteligência da Polícia Civil estava atenta e foi realizada a Operação Medusa, com homens da Coordenadoria de Recursos Especiais (CORE), da 27ª e da 35ª Delegacias de Polícia. Os policias chegaram ao sítio por volta das 4 horas da manhã.
Foi uma operação muito bem sucedida que mostrou que, com inteligência e unidade, é possível vencer o crime no estado. Os presos foram levados em dois ônibus para a Cidade da Polícia e quatro homens que reagiram foram mortos.
Houve represálias dos milicianos que colocaram fogo em uma estação de BRT, mas a ação do último sábado fez renascer a esperança de uma cidade justa e segura.
" A Polícia Civil entrega para a Justiça parte de uma organização criminosa que ainda tenta se impor no estado do Rio. Nós não vamos diminuir nossas forças e vamos atuar incessantemente contra a milícia", disse o chefe da Polícia Civil, delegado Rivaldo Barbosa.
O secretário de Segurança Pública, general Richard Nunes, afirmou que a sociedade do Rio pode confiar na intervenção federal. “A criminalidade vai sofrer uma ação implacável, porque o Rio precisa voltar a ser uma terra feliz, um povo alegre, confiante e trabalhador que merece uma vida melhor”, concluiu.
Na segunda-feira (11), todos os presos tiveram prisão preventiva decretada pelo Tribunal de Justiça. O medo da sociedade de que os presos fossem imediatamente soltos não se concretizou até o momento.
Entrevistas
A equipe do Olerj entrevistou duas empregadas domésticas que trabalham em Copacabana. Uma é moradora da Comunidade do Cantagalo, controlada por traficantes. Outra mora no Rio das Pedras, Zona Oeste, comunidade controlada por milicianos. A identidade das entrevistadas será mantida em sigilo, por motivo de segurança.
Entrevista 1
O que a senhora achou da prisão de 142 milicianos feitos pela polícia neste fim de semana?
Achei muito bom. Tenho medo que eles cheguem no Cantagalo. Os meninos de lá vendem drogas, mas nos deixam em paz.
O que a senhora sabe sobre milícias ou milicianos?
Sei pela TV e nas conversas na igreja. São policiais que dominam tudo e roubam a gente, cobram para gente viver na casa da gente!
A senhora aprova a intervenção federal na segurança?
Não entendo muito bem deste assunto, mas tudo o que for feito pra gente ter paz é preciso apoiar, né?
Entrevista 2
O que a senhora achou da prisão de 142 milicianos feitos pela polícia nesse fim de semana?
Eu não achei nada. Não tenho que achar nada né?
O que a senhora sabe sobre milícias ou milicianos?
Eu? Não sei nada. Não sei nada mesmo.
A senhora aprova a intervenção federal na segurança?
Eu oro a Deus. Deus é que está no comando de tudo.