Roubo de carga no estado do Rio
O crescimento assustador do número de roubo de cargas nos últimos anos no estado do Rio de Janeiro, e principalmente na capital, foi um dos fatores que provocou a Intervenção Federal na Segurança Pública.
Em 2017, o número de ocorrências registrava um aumento de 200% em quatro anos e o roubo de cargas se convertia num grave problema não apenas para a segurança pública, mas aparecia como um elemento de risco para a economia do estado.
Naquele ano, foram registrados mais de 10 mil casos – o equivalente a um roubo a cada 50 minutos. Um prejuízo de mais de 600 milhões de reais para a economia fluminense.
Empresas de transporte de cargas cobravam uma taxa extra para buscar ou levar cargas para a Cidade do Rio. E motoristas começavam a se recusar a fazer transportes para o estado do Rio de Janeiro. Empresários e sindicatos pediam ações concretas e eficazes para garantir a segurança de seus motoristas e suas cargas, ameaçando pararem de abastecer a região metropolitana do estado, onde os índices de assalto eram maiores.
1. A reversão no número de ocorrências de roubos de carga
Entre os crimes contra o patrimônio, os roubos de carga apresentaram uma redução contínua desde o início da intervenção, com percentuais de diminuição em relação a 2017 muito significativos.
Em setembro último, o estado sofreu 577 ocorrências de roubo de carga, uma queda de 15% em relação ao mesmo período do ano passado e o menor número registrado desde setembro de 2015.
Em relação a agosto de 2018, a redução foi de 14% e, num intervalo maior de tempo, nos últimos três meses, a queda em relação ao mesmo período de 2017 foi de 18%.
Ainda comparando-se os mesmo períodos para 2017, o relatório do ISP mostrou que as Áreas Integradas de Segurança Pública, AISP, que apresentaram a maior redução percentual no terceiro trimestre de 2018 foram as AISP 03 (Méier e adjacências), 41 (Pavuna e adjacências), 09 (Madureira e adjacências) no município do Rio, com 60%, 59% e 50% de roubos a menos. A AISP 41 apresentou a maior queda no número de ocorrências. E na Baixada Fluminense, a AISP 20 (Mesquita, Nova Iguaçu e Nilópolis) com 57% de roubos a menos, constituindo a quarta maior queda no número de ocorrências no estado.
No início de 2017, a Avenida Presidente Dutra, na região próxima à Pavuna e ao norte da capital, na divisa com a Baixada Fluminense, era a via de maior incidência de roubo de cargas. Mas como mostram os números do ISP, essa situação vem mudando.
2. A análise do ISP
O ISP divulgou esse mês um infográfico com um estudo preciso sobre o roubo de cargas no estado do Rio de Janeiro.
Entrevista
Entrevista 1 - Motorista de 46 anos, assaltado duas vezes na Dutra.
Você foi assaltado mais de uma vez...
É isso mesmo. Todas as três vezes entrando aqui pela Dutra. Você acredita nisso? Porque tem gente que nem acredita.
Como foram os roubos?
Pior coisa possível que pode acontecer. Na primeira vez eu não entendi direito o que tava acontecendo. Era madrugadinha, o cabra atravessou o carro na minha frente. Os comparsa saltaram, com a maior calma do mundo me tiraram do caminhão e foram se embora. A polícia achou o caminhão na boca da favela.
Não houve violência?
Nada, nada. Os cara calmo, na maior educação. Você acredita nisso? E eu com a maior cara de otário, fiquei largado lá, de madrugada. Mas nessa última vez, em junho, foi mais complicado, mais complicado...
Eles foram violentos com você?
Não me bateram nem nada, mas a situação toda... Eles entraram no caminhão e me levaram junto, pra dentro da favela. Me deixaram lá, na casa de uma mulher, trancado num banheiro sujo. Eu pensei que ia morrer. Pensei mesmo. Confesso a você que eu chorei muito, que nem uma criança, porque eu nunca me vi numa situação daquelas. Deus mesmo que me viu e socorreu. É no que eu acredito. A mulher me soltou lá pras quatro, cinco horas da tarde...
E como você está, continua dirigindo com confiança?
Eu só tenho é medo. Medo mesmo. Não quero mais fazer transporte para cá pro Rio não. Mês que vem o patrão muda minha rota, sabe? Não tenho mais nervos para isso não.
Entrevista 2 - Policial militar, 46 anos, que atua em região de grande incidência de roubo de carga.
Você viveu o período de maior ocorrência de roubos de carga na Dutra?
Vivi sim. Eu estou lotado aqui no Batalhão há muitos anos e a gente acompanhou bem esse aumento. Sempre houve muito roubo de carga na Dutra, mas desde 2013, 2014, a coisa desandou.
Você tem alguma explicação para isso?
Teve vários elementos nisso aí. Teve o Playboy (traficante do Morro da Pedreira, já morto), que aterrorizou a região aqui, botava o pessoal dele para assaltar direto... Mas eu atribuo esse aumento absurdo que a gente viu no roubo de cargas à crise que a gente viveu no governo do estado do Rio. Teve a crise política, que todo mundo viu aí, e teve a crise econômica.
Muita gente não consegue imaginar como isso afetou o nosso trabalho. O dinheiro sumiu e a gente começou a enfrentar condições cada vez mais difíceis para cumprir a nossa função de policiar. Não dá para combater criminalidade sem viatura, sem efetivo, sem armas. Imagina sair à pé por aí...
Você sabe que o 41º Batalhão, da Pavuna, é onde ocorre o maior número de mortes de policiais. Bandido não dorme, não para. Se a gente não tem como acompanhar, a gente perde a guerra.
Mas os números de ocorrências estão caindo muito agora.
É verdade. Mas a gente está vivendo uma situação especial aqui. A intervenção chegou devagar, com dificuldades, mas pegou, conseguiu agir e os números caíram realmente. Mas eu te pergunto, o ano tá acabando, e as forças da intervenção vão embora, como é que vai ficar isso aqui?